UtupiAR: é urgente!

sexta-feira, abril 07, 2006

8 de Março - quarta-feira


Dia 8 de Março, internacionalmente, dia da Mulher! Dia que tem a sua origem no mesmo dia e mês mas no ano de 1908, quando as mulheres trabalhadoras de uma fábrica de Nova York resolvem fazer greve para reivindicar melhoras laborais e 271 morrem devido a um incêndio.
É então um dia de celebração e de homenagem, não só das mulheres trabalhadoras de 1908 mas de todas as que lutaram e lutam contra a desigualdade e a injustiça. Ao mesmo tempo que um dia de reivindicação (como foi proclamado em 1910 na Conferência Internacional das Mulheres Socialistas) de direitos que ainda faltam obter.
Entre outras coisas, em Barcelona, homens e mulheres, juntos na manifestação, exigem um “trabalho assalariado de qualidade e em igualdade de condições”, o “reconhecimento social do trabalho doméstico”, uma “sociedade livre de violência contra as mulheres”, “que os homens sejam co-responsáveis nesta luta”, “uma igualdade real (social), e não legal, que garanta que as mulheres sejam cidadãs de pleno direito, “viver numa democracia plena, baseada em dois grandes princípios: a liberdade e a igualdade das pessoas” e por último exigem um “Mundo no qual homens e mulheres possam viver sem violência” (traduzido do panfleto “Home, La Feina Pendent”). Mais razões podem ser lidas no manifesto do Grupo de Mulheres que se encontra em anexo.

Eu e a Marlene, claro, fomos à manifestação, como observadoras mas acabamos também por sermos participantes.
Estavam muitas mulheres, mas também muitos homens. A diversidade de grupos e colectivos presentes era grande (identifiquei a Amnistia Internacional, um grupo de “Mulheres Verdes”, vários partidos, imensos colectivos e associações feministas... li depois que foram cerca de 50 que aderiram à convocatória – ver anexo) embora mais criatividade fosse necessário. Só um grupo trazia alguns balões brancos pendurados em cartazes e que chamavam a atenção. O resto era o normal: faixas, bandeiras, cartazes, t-shirts....
Alguns exemplos: “Contra a precariedade laboral, planos de igualdade”, “Ni divisic del trabalho, ni doble jorna, ni precariedade laboral, rebelát!”, “Trabalhadoras familiares em luta por uma lei mais justa”,
Havia também os slogans mais reivindicativos, digamos, como “Aborto livre e gratuito”, “Mango, Berska...deixem de controlar as nossas vidas” (afixado num poste de electricidade), “Estamos a construir a nossa liberdade”. E uns mais originais como “Antes morta que submissa” e “Os meus direitos não se negociam”. E os que nos transportavam para realidades de outros países: “Basta de feminicidio. Guatemala: 1,5 mulheres assassinadas por dia.”, “Agora em Chile mandam as mulheres.”
“Homens e mulheres por um mundo mais justo” dizia um cartaz que segurava um rapaz. Também um grupo de homens segurava numa faixa onde se lia: “Pela liberdade das mulheres” . Na altura da concentração, uma situação para mim curiosa, foi a de um senhor velhinho que me veio pedir ajuda porque não conseguia descolar o autocolante da manifestação (que dizia “Dia Internacional da Mulher”) do papel para colar no seu casaco. Lá o ajudei e foi bom vê-lo escapulir-se para o meio dos manifestantes, pronto para participar.
Havia também cartazes noutras línguas, principalmente no grupo dos imigrantes, que proclamavam, entre outras coisas: “A lei do estrangeiro é violência de género”, “Papeis para todas”.... Por causa deste último slogan assisti a uma cena engraçada: um homem do grupo dizia “todos” em vez “todas” e elas olhavam para ele com um ar recriminatório e ralhavam-lhe zangadas. Acabou tudo a rir-se, e eu lembrei-me de como ás vezes as discussões por causa da linguagem, das palavras, não valem muito a pena. O homem estava lá, com elas, a manifestar-se. Que importa que diga todos ou todas? É que das duas uma: ou é por esquecimento de usar o politicamente correcto “todos e todas” (e agora qual é que vem primeiro) ou por brincadeira.

Durante o percurso de cerca de 2 horas, no qual várias pessoas se foram juntando, umas raparigas de um grupo feminista anarquista (acho eu) colavam cartazes nas lojas de roupa, onde se podia ler, entre outros: “já não encaixo nos cânones de beleza. Rebel-la’t!” e “as mulheres que querem ter filhos têm mais dificuldade em conseguir emprego”. Esta acção espontânea chamou bastante a atenção das pessoas que àquela hora passavam atarefadas pelo local ou entravam e saíam das lojas; arranjavam um tempinho para parar e ler as mensagens, tiravam fotos com o telemóvel, comentavam com os amigos. Também chamou a atenção dos segurança das lojas, claro, e quase que as raparigas tinham problemas.

Claro que depois este assunto foi pano para mangas para reflexões e discussões com a Marlene sobre manifestações e suas formas de acção. Minha conclusão: embora eu me identifique com formas de acção e manifestação pacificas e não violentas, compreendo quem age de forma menos pacífica, embora quando envolve pessoas inocentes condene completamente.
Outra conclusão: é preciso ter em conta que as manifestações são um conjunto de manifestações individuais; ou seja, não se pode pôr tudo no mesmo saco (e os média têm muita culpa nisto), não é porque vemos na televisão uns manifestantes a atirar um cocktail molotov para os policias, que todos os participantes da manifestação são “uns vândalos violentos”. Há que desmistificar esta situação, e isso não passa por ficar em casa e não participar, mas sim participar de forma criativa e pacifica.

Voltando ao assunto do Dia das Mulheres, mais tarde fiquei a saber que o “Movimento de recolzament a Migjorn” convocou uma concentração de manhã em frente à câmara para reivindicar o reconhecimento do direito de todas as mulheres de poderem escolher onde e como querem “dar à luz”, se em casa, se no hospital.

Não sei o que fizeram em Portugal, se houve manifestações ou não, se um 100 número de debates, conferências, ciclos de cinema de e sobre a Mulher também tiveram lugar.
Mas porque há sempre motivo para criticar, dizer mal, lutar, propor alternativas, o que quiserem ou tudo isto e mais alguma coisa, eis alguns dados que o justificam, referentes ao ano de 2005 em Portugal:
- “registaram-se 17811 queixas por violência doméstica;
- anualmente morrem em média 2 mulheres e 5 mil são hospitalizadas por motivos relacionados com o aborto clandestino;
- dos 13 membros do Tribunal Constitucional, 4 são mulheres;
- dos 20 membros do Concelho de Estado, 1 é mulher;
- dos 17 membros do Concelho Superior de Magistratura, 2 são mulheres;
- as mulheres ganham em média 76,7 % do que os homens recebem;
- embora as mulheres constituam 62,8% da população com menos de 35 anos com Ensino Superior, a taxa de desemprego feminina é superior à masculina (11,6% face a 6,2%).”
Li estes dados editados num panfleto da Não te Prives (www.naoteprives.org), intitulado “Porque celebramos o 8 de Março?”. Espero que o tenhamos celebrado tod@s: mulheres ou homens, trabalhadoras/es ou não trabalhadoras/es.

Hoje antes de irmos para casa ainda fomos visitar a RAI (Recursos de Animação Intercultural – www.pangea.org/rai) porque havia uma sessão de poesia e música gratuita. Parecia um bar cultural, com muita informação afixada, panfletos... Ficamos só para a música.
Seguimos para casa, que estava vazia. É incrível como às vezes Barcelona com tanta gente é ao mesmo tempo tão sozinha. Preciso de amigos aqui e agora!

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